"Ler, escrever e fazer conta"

Na manhã de sexta-feira (26/4), Jair Bolsonaro propôs o fim dos investimentos federais nas faculdades de Filosofia e Sociologia. Acrescentou, pela sua conta no Twitter, que o objetivo é ensinar a juventude a ler, escrever e fazer conta, para que depois se ensine um ofício que possa gerar renda. Segundo o governo, o país deve focar em áreas que gerem retorno imediato à população, como veterinária, engenharia e medicina. O mentor da ideia é o Ministro da Educação, Abraham Weintraub.

Unida a esta declaração, nas últimas semanas o presidente também afirmou que “não quer jovens pensando em política, como é hoje”, além de alegar que não há pesquisa na universidade pública – sendo que esta é responsável por 95% da produção científica no país.

As declarações do presidente, que vem se pautando por uma linha revisionista e anticientífica, é atacar diretamente a educação pública, estudantes e professores, e evitar respostas à precarização do trabalho e, principalmente, ao desemprego – que chegou aos 13 milhões no Brasil.

Os ataques e o desprestígio pretendidos pelo governo federal em direção às ciências humanas também não são inocentes. Baseadas na crítica, dialética e distanciando-se do senso comum, a filosofia e a sociologia têm papéis fundamentais na análise e reavaliação das políticas públicas e das contradições que possamos viver como sociedade. São basilares na construção dos demais saberes e ciências, no raciocínio, na formulação de conceitos, na interpretação dos problemas e não um “luxo” como declarou o atual Ministro da Educação.

O corte de investimentos em ciências humanas é um debate moral que não garante o investimento em outras áreas, não garante a empregabilidade, senão que justifica materialmente a destruição do serviço público.

TÁTICA VELHA
A proposta do governo federal de atacar o saber científico e a análise crítica não é nova. Na história antiga, os métodos críticos e de debates irritaram as oligarquias e as classes dominantes, que temiam uma insurreição contra o que era proposto como governo. Sócrates, por exemplo, por ter se posicionado contra o então parlamento e afirmado que seriam incapazes de representar a população, foi acusado de “corromper a juventude” com suas ideias e, finalmente, condenado a tomar cicuta.

Na história recente, a economia clássica do século XVIII propôs a educação de um homem domesticado, anulando o ser político e sua atuação em conjunto. Adam Smith, por exemplo, teórico do liberalismo econômico, justificava a educação em função da divisão do trabalho. Para ele, o Estado deveria propor – ou impor, se fosse o caso – que a população apenas tivesse acesso aos saberes básicos para as demandas mercantis, como ler, escrever, contar e ter conhecimento dos rudimentos da geometria e mecânica. A proposta era que, assim procedendo, o povo seria “ordeiro e disciplinado” aos seus superiores.

Hoje, tendo as reformas e cortes encomendados pelo setor financeiro, o governo federal tenta impor uma agenda de destruição do pensamento crítico, da organização e da distribuição de conhecimentos que a humanidade acumulou durante sua história, ao mesmo tempo em que criminaliza previamente professores e estudantes para justificar o desmonte da educação pública.

A “descentralização” do investimento no ensino superior em filosofia, sociologia e em humanidades é uma demanda para esvaziar o debate político, na proposta de construir um sujeito passivo diante de todas as contradições que o sistema político e financeiro vem demonstrando, como as reformas contra os trabalhadores, os congelamentos de investimentos e a venda do patrimônio público.

A resposta a estas ações, no entanto, devem surgir justamente da mobilização e organização da classe trabalhadora, da juventude e de toda a população.


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